sexta-feira, 29 de junho de 2012

Chuva no deserto.

Lançamento de Chuva no deserto de Ana Isabel Falé,
dia 30 de Junho, sábado,pelas 16 horas, vila Alda, em Sintra,
Junto ao Museu de Arte Moderna.
Apresentação a cargo do poeta e historiador João Maria Nabais.

A colega e amiga Ana Falé é uma feiticeira de palavras,  na verdade, só  um feitiço faria chover no deserto. Aqui fica uma pequena amostra das suas bátegas.

Os  Cavaleiros
Vieram os cavaleiros e povoaram o dia.
Traziam lanças e espadas e broquéis
montados em levíssimos brancos corcéis
e
vieram em hordes galopantes, crinas ao vento,
corações de aço, ensopados os corpos
no suor acre dos animais,
anunciar que hoje se cumprem os sinais
da última noite que encerra as demais,
e
o sol mergulhou em câmara ardente, lago infernal
de vulcão latente e aquecendo as gentes, as iludiu
julgando-se estas em tempo de benção permanente
e
nos corações mais amenos, escondeu o sol os seus raios.
E nos cavaleiros os homens viram apenas,
a imagem flutuante do sonho.
Quando veio a noite e os céus se rasgaram em violáceas
pinceladas de roxo azulado e denso, e do céu caíram nuvens
de negro incenso, os homens guardaram o sonho
e
os cavaleiros entraram por ele a dentro com suas espadas
e faces sem rosto
e das suas mãos negras saíram golpes de fogo
e os homens no seu sono, montaram os brancos corcéis,
para desaparecer no rasto de mil sóis sem retorno
como nos contos imorais, presos aos cabelos esvoaçantes
de mulheres incandescentes, corpos celestiais onde o desejo
se prende e não se sacia jamais.
Vieram os cavaleiros e o coração dos homens não leu os seus lúgubres sinais.
28/01/03

Mais feitiços, Clicar aqui!

sábado, 23 de junho de 2012

Mujimbos


A propósito de mujimbos, mujimbeiros e outros dacls que tais.

Nos últimos dias têm corrido os mais estranhos e nefandos “mujimbos”. Os “mujimbos “são coisa estranha, normalmente, surgem do desespero e da necessidade de esconder a verdade e instigar toda a espécie de trapaça e divisão. Poderia escrever-vos muitas palavras, muitas palavras de muita e variada semântica sobre a natureza progenitora do que e de quem se esconde atrás do boato, mas, como vos considero e vos tenho como pessoas capazes de pensar pela própria cabeça, partilho convosco um pequeno texto que, tomo a ousadia de considerar útil para toda e qualquer circunstância da vida, mais importante quando se ensina. Pois, professor não é só aquele que transmite, antes de tudo o mais é, sobretudo, aquele que questiona. Questionem-se, questionem, a mentira facilmente nos bate à porta, mas só entra se deixarmos, só entra se estivermos distraídos. O verdadeiro “mujimbeiro”, o construtor e difusor dos mujimbos (boatos) é uma espécie de coisa, que alguns dizem parecer-se com uma folheca de couve sarnosa e malcheirosa de género indeterminado. Usa as palavras falsas, com a farsante intenção de revelar um poder que não tem, nem terá. O dacl é o seu grande problema, santo-e-senha é a sua arma predileta, a sua doença fatal: é adversário, dacl; é alto, dacl; é baixo, dacl; não gosta dele, dacl; não faz o género, dacl. O dacl é pai, mãe, tia, avó, etc. O dacl é até uma grandessíssima qualquer coisa…
Por isso, Diz As Coisas Levianamente, sem perceber o essencial, é que se não morrer do mal, morre da cura.
Uma última nota: a mentira não revela o mentiroso, não esconde a face de quem a diz e a constrói, repito nada revela e nada esconde, mas uma coisa ela mostra e escancara: o lado perverso, verme e nauseabundo dos que temem a verdade. Como escreveu um filósofo: “ a mentira é a negação do ser em devir, um não ser.” Não ser é muito grande para o verdadeiro nítido nulo que é o mentiroso, digo eu, e passo ao texto que vai sendo tempo:

"Não se apresse em acreditar em nada, mesmo se estiver escrito nas escrituras sagradas. Não se apresse em acreditar em nada só porque um professor famoso disse. Não acredite em nada apenas porque a maioria concordou que é a verdade. Não acredite em mim. Você deveria testar qualquer coisa que as pessoas dizem através de sua própria experiência antes de aceitar ou rejeitar algo."

(Siddartha Gautama, o Buddha, Kalama Sutra 17:49)
 


sábado, 9 de junho de 2012

Escrevo

Foto: Luís Sérgio " Sonho azul"



Mais de três anos a escrever NO CORAÇÃO  DA ESCOLA, publiquei o primeiro texto em 31 de Maio de 2009 (ver aqui). A todos os seguidores, leitores e amigos dedico o post de hoje. 

Escrevo

Escrevo porque existo
Escrevo porque digo não.
Escrevo porque sinto
Escrevo porque sou
Escrevo pela razão.
Escrevo porque não desisto.

Escrevo porque estou
Para viajar
Pelo sonho
Pelas palavras
Porque gosto
de palavras
e com elas brincar.
Escrevo para dizer não
Escrevo para ser.
Escrevo porque apetece.
Escrevo sou.
Escrevo porque gosto de brincar
com as palavras,
com palavras.
Porque sonho
Porque vivo
Não desisto
Escrevo por tudo
Por nada
Por um fim
E sem fim.

Escrevo por ti
Porque te sinto
Porque pressinto
Não desisto
Porque vou
Nomeio
Estou.
Escrevo porque escrevo
Sem razão,
Às vezes com o coração.
Porque viajo
Grito.
Por revolta
Para andar à solta
Para voar
Para crescer
Para me entreter
Para esquecer
Para nomear
e lembrar as palavras
de que gosto,
que adoro.
Escrevo para não esquecer
a liberdade de ser.
Escrevo, porque escrevo
Porque não, para dizer não,
Para dizer não. Não!
Pela razão.

Escrevo para ser tudo
o que não sou.
Escrevo para ver tudo
o que não vejo.
Escrevo num desejo
de inventar
um barco para viajar,
para me levar
nas asas do sonho.
Escrevo para existir
para  partir
para sonhar
para estar onde não estou.

Escrevo porque não sei.
Escrevo para dizer não!
Escrevo porque sim!
Escrevo.
Escrevo para criar
tudo o que não escrevo
no que escrevo
e sou capaz de inventar.
Escrevo para amar
ser
estar.
Escrevo para a vida
que existe para lá
do que somos
e inventamos a escrever.
Escrevo!

Luís Sérgio
Agosto de 2010