sábado, 6 de março de 2010

Indignação

Indignação/Vergonha

“ Nunca te deixes silenciar pelo bullying. Nunca permitas que façam de ti uma vítima. Não aceites a definição de vida de ninguém, define a tua própria.”

Harvey Fierstein

O medo mata mais que a morte”, diz o poeta. Sem dúvida que o medo mata antes de morrer, assim vai a realidade das escolas portuguesas, escolas de medo, de abusos de todas as espécies e cada vez mais abuso de poder. A Escola tal como a sociedade em que se insere está cada vez mais violenta, mais castradora, mais opressiva para todos quantos nela trabalham: professores; alunos e funcionários. As acções de “ Um ou mais indivíduos que infligem agressões físicas, verbais ou emocionais sobre o outro – podendo assumir ameaças (e concretização) de danos físicos, posse de arma, extorsão, violação de direitos cívicos, insulto e agressão, actividade de bando, assassínio e, cada vez mais, assédio sexual” estão infelizmente em crescendo nas escolas portuguesas.

Num espaço onde as regras não são para cumprir, emerge o poder do mais forte, ou seja, um conjunto de acções que é moda hoje sintetizar na expressão bullying. Independentemente, do que lhe chamemos, este poder, esta inacção de cumprimento pelas regras e de total desrespeito pelo outro, pelos outros, manifesta-se entre alunos, de alunos para professores, porque é isso que acontece em muitas salas de aula, onde o professor está manietado, já que a maior parte se transformaram em espaços de entretenimento e não lugares de aprendizagem. Grande parte das salas de aula portuguesas transformaram-se em lugares de omissão, sobretudo, omissão do saber, do respeito pelo outro e da omissão de regras.

Quem são os responsáveis por este bullying que atinge todos os sectores da escola? Não me venham dizer que somos todos! Essa é uma forma de deixar mais uma vez que a culpa morra solteira. Em meu entender os carrascos, os réus, são os decisores das políticas educativas dos últimos anos. Sim. Quem promulgou toda a espécie de legislação que visa transformar as escolas públicas em favelas sem qualidade e sem lei. Qual tem sido a preocupação destes senhores em relação à escola: domesticar os professores, proletarizá-los, submetê-los às suas políticas abjectas de privatização a médio prazo de todo o ensino. Qual a lógica de poder instituído nos estabelecimentos. Uma lógica de bullying, de exercício de poder que não pode ser questionada por quem diariamente é, cada vez mais, vítima. As instâncias exteriores decidem, porque é esta a lógica, uma lógica de omissão, de silêncio, de não saber. Por isso, compreendo, mas não aceito, não me calo, sinto-me revoltado, indignado, com o que se passou na Escola EB2,3 Luciano Cordeiro em Mirandela, uma criança de 12 anos morreu, tudo indica vítima de bullying. A Escola no dia seguinte abriu as portas, tudo funcionou como se nada tivesse acontecido. Foi só uma criança que morreu, ainda por cima pobre. Que filhos-da-puta estes, como é possível?!

Nas escolas portuguesas comemoram-se toda a espécie de dias, dia dos afectos, dos namorados, da cidadania, etc., etc., fazem-se postais, colam-se cartolinas, embrulham-se múltiplos valores, fabricam-se engenhosamente, muito engenhosamente, toda uma miríade de folclores, que não passam disso mesmo, folclores sem sentido e sem valor. Senão como compreender que se fique indiferente perante o valor supremo que é a vida. Ainda mais a vida de uma criança. Tenho vergonha e não me calo, o murro no estômago foi grande, esta não é a minha escola, este não é o meu país. Se calhar… é por isso, que, neste lodaçal, quando alçados ao poder até os Cavalos de Tróia sorriem. Por mim, apetece-me chorar com vergonha.

12 comentários:

  1. Pois é, Luís,
    E depois fala-se disto como se fosse um fenómeno novo (até pelo estrangeirismo) e não produto de 30 anos de transformação das escolas em ATL!
    Fizeste bem também em mencionar o "bullying" que se vai exercendo globalmente pelo novo modelo de gestão a famigerada Milu.

    Um abraço

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  2. Luís Sérgio !
    Que excelente análise, texto de grande lucidez e como diz o colega David boa relação com o modelo de gestão.
    É verdade que começa a aparecer o bullying provocado pelos senhores directores.Ninguém duvide.
    Bj,
    Professora

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  3. Caro colega !
    É bem verdade, adorei este post sentido e inteligente. A violência escolar não é novidade, acentuou-se com todo o eduquês e, com a MILU, nos últimos tempos, assumiu uma faceta mais dura e tenebrosa conta os docentes. temos mais assédio moral, mais depressões e o pior virá nos próximos tempos.

    Cordiais saudações !

    Anabela M.

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  4. luís:
    parabéns pelo post.
    é uma vergonha que seja preciso haver uma morte para se começar a falar no assunto.
    o responsável merece ser castigado!!
    vamos todos fazer o tal minuto de silêncio, amanhã, às 11 da manhã, pela vítima mortal do bullying. PAZ À SUA ALMA!

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  5. Do Óscar Martins , via e-mail :

    Caro Luís Sérgio,


    Realmente, uma situação inqualificável em termos de resposta do Sistema.

    E, tal como diz, há dias para tudo (incluindo verdadeiras palhaçadas !), mas parece que não para o que é importante.


    Um abraço,
    Óscar

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  6. Caro Luís:

    Grande análise ao fenómeno que nos recusamos chamar de "vitimização"... Porque não são só as crianças que são vítimas, nós também o estamos a ser embora os agressores (eu prefiro o termo «violentadores») sejam outros.

    O que origina uma bola de neve...

    Mas se este foi um caso mediatizado, por causa das consequências últimas, outros há que ainda não vieram à luz do dia!

    E nós, Professores, devemos estar atentos!

    Grande abraço

    Armando Inocentes

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  7. Companheiro !
    Assim mesmo é que é, dá-lhes com força, essas meretrizes já não merecem o nosso respeito.Há demasiadas vítimas nas escolas e, essa forma de violência que é o assédio moral exercida pelos novos ditadores das escolas ainda vai dar muito que falar. Vai! Vai! podes crer. Alguns que eu conheço são de uma ignorância tamanha e refugiam a sua estupidez no poder cego que exercem. Não desistiremos, mais uma boa chapelada para o teu blog.

    Grande abraço,
    Filipe

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  8. Caro Luís
    Nas tuas palavras é fácil sentir a dor e a raiva que esta morte nos provoca. Estúpida, como todas as mortes que acontecem antes de tempo, apenas porque há os que teimam em contrariar, de forma tão violenta, o ciclo natural da vida. O bullying sempre existiu mas nos tempos que correm, a expressão da agressividade e do domínio sobre o outro, transpôs toda e qualquer fronteira. A escola é um reflexo do que encontramos para além dos seus muros, no seio da comunidade, nas famílias, nos locais de trabalho, etc.. Se os adultos o enfrentam com tanta dificuldade, quanto às crianças, para essas, é demasiado pesado, incompreensível e devastador. Infelizmente, na escola, tal como fora dela, os contornos do bullying não são só expressos entre os alunos, encontramo-los também entre os adultos, de modo mais ou menos subtil ou, pelo contrário, mais ou menos angustiante. A verdade é que o desgaste, a raiva, o medo, a depressão, são expressões emocionais claras e importantes relativamente às quais devemos permanecer atentos para que o ciclo de vida não se antecipe, não se rompa, não se desvirtue.
    Obrigada pela tua reflexão, como sempre, tão oportuna e profunda.
    Bem-hajas
    Guida

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  9. Afinal já não são só os alunos...

    O que se passou com o nosso colega de Fitares?

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  10. Caro Armando !
    Só hoje passei pelo blog com algum tempo. Pois , não restam dúvidas que o que se passou com o colega de Fitares é o que se está a passar pelas escolas portuguesas em geral e, que nós denunciamos há muito.
    Agora, infelizmente, está-se talvez por causa de jogos de poder internos a procurar um bode expiatório errado, a directora do agrupamento. Em meu entender, os responsáveis são todos aqueles que nos últimos anos transformaram as escolas em espaço sem lei, sem regras e de sucesso a qualquer preço.
    Qualquer professor que se preocupe em defender a distinção entre o bem e o mal, coisa tão simples elementar é visto como um lunático. sobre este caso e os verdadeiros responsáveis há muito para dizer, um dia destes com tempo farei um post.
    Obrigado pela tua colaboração e de todos os colegas que comentam e reflectem sobre o que escrevo. Tenho aprendido muito com os vossos comentários e também fico com a agradável sensação de que não estou.
    sozinho.
    Grande abraço,

    Luís Sérgio

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  11. Este artigo de opinião também merece divulgação http://www.correiodominho.pt/cronicas.php?id=1403

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  12. Caro (a) Prof. História !

    Bem-vindo(a) ao blog e muito obrigado pela excelente texto que divulgou.

    Cordiais saudações e volte sempre.

    Luís Sérgio

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