domingo, 26 de outubro de 2014

Inclinados



 “… sondagem da Universidade Católica para o DN,JN;RTP e Antena 1 mostra que 45% dos portugueses estão inclinados a votar PS nas legislativas.”
Excerto retirado de notícia de capa do Diário de Notícias (19 de Outubro de 2014) versão impressa. Sublinhado de “ No Coração da Escola”.
Confesso que os resultados da sondagem não me impressionaram, na verdade o que levou à minha reflexão e preocupação foi a utilização da palavra “inclinados”. Intencionalmente, não me refiro às diferentes aceções de inclinados, interessa-me para já e só a semântica, ou seja, o significado ou significados da palavra.
O ponto de vista ou lugar onde nos encontramos condiciona, todos sabemos, aquilo que vemos ou até tentamos ver. Durante largos minutos interroguei-me se da parte do jornalista existiria uma intenção meramente informativa. Quereria informar que, de acordo com a sondagem, uma percentagem de votantes portugueses estará disposta a votar num determinado partido político? Assumindo que seria esta a intenção, podemos ler a notícia como manifestação de uma tendência, de um sentido de voto.
A minha leitura da notícia foi muito além do que supostamente desejaria o jornalista, erro meu sem dúvida. Habituado a ler e a pensar em termos de metalinguagem lembrei-me de outros significados da palavra inclinados e mesmo do verbo inclinar. Daí que tenha lido a noticia como:
Portugueses estão abaixados; portugueses estão dobrados; portugueses estão curvados; portugueses estão reverentes; portugueses estão desviados da verticalidade. 
Sem surpresa, algo triste, pensei:
Alguns portugueses (habitantes de um dos mais obedientes protectorados  alemães), país à beira do precipício , estão pendentes e sem verticalidade, quiçá mesmo inclinados e sem salvação. Triste sina a daqueles que não querem ver, má memória a dos que não querem recordar. Se olhassem e se vissem, se recordassem e refletissem, se contemplassem o horizonte perscrutando e interrogando, se se imaginassem como peixes, se, por alguns instantes, encarnassem a vida de peixes inclinados e subjugados veriam junto à margem um isco apetitoso e apelativo, sem demora correriam ao alimento fácil. Mas, se por força das marés hirtas pudessem observar fora de água toda a movimentação de Costa veriam um anzol.
Último pensamento - Será que os portuguese são como os peixes?
- Não sei, apenas recordo que há um provérbio japonês que nos diz:
“ O peixe não vê o anzol, ele só vê o isco”.
Terá sido por isto, imagino, que o Padre António Vieira dedicou grande parte da sua vida a fazer sermões aos peixes. Oxalá que nos mares brasileiros tenha servido para alguma coisa, por cá parece que não serviu para nada. Por isso mesmo, não tarda que a caça ao gambuzino seja o grande desígnio nacional.

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